terça-feira, 9 de novembro de 2010

PORTINARI

Cândido Portinari: a cara do Brasil

“O duque inglês admira a técnica, mas os temas não o seduzem. “O senhor não teria algumas flores?”, pergunta a Portinari. “Flores, não”, responde o pintor, ressentido. “Só miséria.” (GÊNIOS DA PINTURA, p. 2)

Candido Portinari nasceu no dia 30 de dezembro de 1903, em Brodósqui, no interior do Estado de São Paulo. Foi nessa pobre cidadezinha que Candinho, como ficou conhecido pelos amigos, viveu toda sua infância. Ele era de origem humilde, e não tinha grandes perspectivas para o futuro. Temia fracassar. Por isso, evitava se relacionar socialmente, a não ser que fosse para exibir seus dois maiores talentos: o futebol e o desenho.
Enquanto isso, Portinari crescia paralelamente a produção cafeeira. Durante sua infância, viu o café migrar do solo do Vale do Paraíba para as terras férteis do oeste paulista. A construção de estradas de ferro permitiu escoar a produção até o porto de Santos, e dali para o mercado mundial. Um pouco antes, a Princesa Isabel havia decretado a liberação da mão de obra escrava. Com isso, o governo paulistano ofertava fortemente vagas de trabalho nas lavouras de café. Assim, ao redor das terras e das ferrovias, surgiram pessoas, cidades e esperança.
Nada aconteceu por acaso. Sua condição de vida precária, seu gosto pelo desenho e pelo futebol, e o crescimento da produção cafeeira renderam-lhe inspiração para criar o que mais tarde seriam seus maiores bens: os quadros.
Cansado de viver na miséria da pacata cidadezinha, Portinari foi para o Rio de Janeiro lutar pelo seu sonho. Ele queria mesmo era pintar. E conseguiu. Em 1928, ele participou do Salão da Escola de Belas Artes, e apresentando dois retratos, foi premiado. A recompensa lhe garantiu uma viagem para Paris e a permanência na Europa por dois anos.
Durante essa época, as características das obras européias, tais como expressionismo, impressionismo e cubismo, ainda não vigoravam nas artes brasileiras. O academicismo era forte demais. Durante sua estadia na Europa, Portinari observava, discutia e estudava os estilos das artes européias.
Inspirado por tudo que viu, o quase acadêmico Portinari retorna ao Brasil um verdadeiro modernista. Mudou inclusive seu objeto de preocupações. Agora Portinari não pintava apenas retratos; reproduzia a realidade brasileira, concentrava-se no homem simples, ilustrava um cenário de desigualdades sociais.
O quadro fundamental dessa época foi O Café. Nele, o pintor revelava a dificuldade do trabalho no campo a partir da “deformação” dos pés e das mãos dos personagens, marcando o aspecto social de sua obra. A tela foi exibida na Exposição Internacional de Arte Moderna, promovida nos Estados Unidos pela Fundação Carnegie. Com reconhecimento internacional, Portinari conquistava cada vez mais liberdade criativa, abertura para um estilo mais arrojado e menos vulnerável à crítica. Foi também a partir de O Café que Portinari descobre que sua vocação é ser muralista, e não um pintor de quadros de cavalete.
Com o prestígio alcançado pela premiação na Fundação Carnegie, Portinari começou a ser convidado para diversos trabalhos, abandonando de vez o academicismo e sendo intitulado “artista oficial”. Entretanto, com a implementação do Novo Estado, o Brasil enfrentou um conturbado período de mudanças políticas. Sem estabilidade no seu país de origem, Portinari viu crescer sua fama no exterior. O governo norte-americano, por exemplo, solicitou que ele executasse murais para a Biblioteca do Congresso em Washington
 Com a eclosão da Segunda Guerra Mundial, Portinari vigora na sua fase expressionista. A partir da degradação causada pelo conflito, o artista reproduz a miséria a sua volta, refletindo esse espírito até mesmo em decorações na capela de Pampulha, em Belo Horizonte.  É dessa época também a série dos Retirantes, com personagens que personificam a agonia dos retirantes do sertão nordestino.
Outra fase da obra de Portinari começa com A Primeira Missa do Brasil. Agora, ele não estava mais preocupado em denunciar as situações sociais, e sim em compor a pura representação da missa. As composições eram bem mais sóbrias, apostando no contraste entre as cores. Obras como Tiradentes e Guerra e Paz são desse mesmo período.
Com o tempo, o estilo de Portinari começou a ser questionado. Os artistas mais jovens avançaram no modernismo brasileiro para além do expressionismo, e como Portinari não pintava quadros abstratos, teve seu estilo superado. Ele manteve sua técnica inalterada, e buscou outros lugares que aceitassem sua pintura. Contudo, a intensidade e a vitalidade que caracterizavam o Portinari de fases anteriores perderam-se no caminho, até 6 de fevereiro de 1962, quando Portinari morreu. 
Superado ou não, Cândido Portinari foi o pintor que representou a realidade brasileira com mais singularidade e autenticidade.  Suas obras desenham a realidade social, a formação econômica, a história política do país, os costumes, a herança indígena, o sentimento religioso da população e a afirmação estética da arte nacional. A importância das pinturas de Portinari não se limita às discussões da identidade nacional; está associada, sobretudo, ao processo de identificação cultural brasileiro.

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